Desde pequeno que ouço falar de você. Nasci numa cidade muito pequena. Meu pai, carpinteiro de mão cheia, me ensinou a fazer uma cadeira após comprar ferramentas pequenas para meu labor/aprendizado. Mas ele não queria que o filho seguisse a mesma trilha. E dizia: “Você vai ser engenheiro, construir pontes, prédios, casas”. E me lavava aos bares onde mal conseguia enxergar as bolas do sinuca. Ele me colocava num banco alto e repetia pra todo mundo ouvir. “Tá vendo aquele ali, é meu filho, futuro engenheiro”. Eu nem imaginava o que fazia um engenheiro. Minha cidade mal tinha água encanada e a luz elétrica desligava às 21h. A primeira TV, em preto e branco, chegou lá pelos idos de 1970. Foi ele, meu pai, quem fez a caixa e a instalou no mercado municipal, no alto. A inauguração teve show de Nélson Ned e tudo. O show era apenas para adultos, mas minha curiosidade não me deixou dormir. Aos seis anos, fui à tal inauguração. Fiquei quase embaixo do palco. O cantor, que tinha uma estatura pequena, eu mal podia vê-lo. Mas sua voz, ah, essa estrondava nos alto falantes. Fiquei no show até ele anunciar a última música. Fui para casa e fingi estar dormindo. Meus pais nem desconfiaram.
Um dia, quando me preparava para viajar com meu pai para uma cidade vizinha e a marinete demorou de chegar, fiquei observando a cidade ao longe. Chovia muito e nos acomodamos numa marquise de um bar que fingia ser uma rodoviária. Tinha muita gente e todos se acotovelavam em busca de abrigo. Foi aí que me lembrei do que meu pai dizia pra todo mundo: “Um dia tu serás um engenheiro”. E pensei comigo. Se eu me formar nessa tal de engenharia, a primeira coisa que vou fazer vai ser cobrir a cidade toda de telhas, para que ninguém se molhe da chuva. Ainda bem que não me tornei engenheiro.
Hoje tenho 58 anos e desde os 22 atuo como comunicador. Jornalista, radialista e gestor ambiental. Bem que na gestão ambiental tinha a oportunidade de fazer engenharia e realizar o sonho do meu pai, mas não fiz.
A palavra futuro ainda permeia a minha cabeça desde pequeno. Quando jovem estudante secundarista, e como todo jovem, o mundo passa em sua cabeça. Construir pontes, viajar, conhecer lugares, comidas e pessoas, navegas por terras nunca dantes navegada e lançar minha âncora num porto bem distante. Mas não tive a coragem e o incentivo para ganhar o mundo.
Me acomodei com meus afazeres da comunicação, mas o futuro nunca deixou de frequentar minha cabeça. O que é esse tal de futuro? Respondiam-me, como que já tivessem visto. É amanhã, algo próximo ou muito distante. Quando os filhos brotaram eu passei a pensar no meu futuro e no futuro deles. Era uma confusão e ainda continua. Encerrei minha prole com cinco filhos e a palavra futuro ainda martela minha mente.
A cada lugar novo, a cada história nova, a cada fantasia interessante minha mente se transporta para o futuro. “No futuro quero morar aqui”. É o que penso de cada lugar que visito ou que conheço através dos livros e da internet.
O que esperar do futuro daqui a três anos é muito incerto. Já não tenho os sonhos adolescendo em minha cabeça, mas ainda trago a força de minha mãe professora e de meu pai carpinteiro, que martelava nosso futuro em pregos e madeiras, mas não plantava seus próprios sonhos. Ser um engenheiro, um avô, um escritor, um poeta, quem sabe. Ainda espero muito de você, tal futuro. Não sei o que serei daqui a três anos, mas espero ter sombra e água fresca, dias menos sombrios para a humanidade, filhos e netos no caminho da paz e do progresso, menos individualistas e mais coletivos, mais humanos e menos egoístas, é o que espero.
O futuro é logo ali, em três ou 30 anos, tanto faz.
Até lá.