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Minha primeira lição de xadrez

Nesse teatro de operações muitos são amadores, como se vê – mas alguns são profissionais. Como disse o Mestre Adolfo Boos Jr, ao dar o cheque mate no quarto lance de minha primeira lição de xadrez.

10/01/2023 às 20h39 Atualizada em 10/01/2023 às 20h46
Por: Vanderley Soares Fonte: Edson Borges
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Minha primeira lição de xadrez

“O Brasil viveu neste domingo uma página triste e lamentável de sua história”. Por volta das 15h, manifestantes invadiram a Praça dos Três Poderes e depredaram, com pedaços de pau, pedras e extintores de incêndio, as instalações do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso. Cerca de vinte policiais tentaram conter a multidão com pequenos jatos de gás. Inutilmente. No inicio da noite retrocederam, sem enfrentar o batalhão de choque que finalmente se posicionou e, sem agredir, os acompanhou e deteve 300 pessoas, acusadas de golpistas e terroristas. Os autos da prisão em flagrante, contudo, tipificam apenas os crimes de danos ao patrimônio e incitação à violência.

 

O Presidente da República não soube, antecipadamente, dos riscos. É razoável supor, todavia, que os serviços de inteligência do Estado, e do Governo, sabiam. O Ministro da Justiça declarou que monitorava o movimento, desde alguns dias, conjuntamente com o Governo Distrital, que a Força Nacional estava de prontidão desde ontem, para o caso de necessidade, e que às 23h fora informado de possível alteração nos planos da turba. Durante a manhã, o Ministro da Defesa, em carro blindado, circulou entre os manifestantes. E mesmo assim não se pôde evitar a maior falha, talvez, do aparelho estatal em todos os tempos.

 

Não parece, todavia, ter sido uma tentativa de golpe. Sem apoio institucional, sem tropas, tanques, blindados, metralhadoras, morteiros, fuzis, talvez apenas os invasores pudessem confiar no sucesso de tal empreitada. Os mandantes, não (nem o governo). Seu objetivo, e plenamente alcançado, pode ter sido apenas tumultuar, desmoralizar, com mais essa insanidade, a nova administração do país. Corrobora essa suposição o fato de que nenhuma autoridade foi molestada nem houve mortes ou feridos, à exceção de um cavalariano apeado de sua montaria e espancado. Uma viatura foi tombada no espelho d’agua, os retratos da galeria de ex-presidentes foram destruídos e uma obra de Di Cavalcanti recebeu seis facadas. Foram apreendidos uma faca peixeira, um isqueiro e alguns cilindros de gás. Era domingo, e todos os prédios se encontravam vazios...

 

O Presidente da República decretou intervenção na SSP, e declarou que “Vamos tentar descobrir quem financiou [...] o churrasco”, etc. O ex-Presidente, ausente do país, disse que nada tem a ver com os fatos. O Interventor, que “houve erro, mas não por incompetência”. O Chefe da Policia Legislativa, que pediu reforço policial na noite anterior. Acusações de leniência, incompetência, negligencia, conivência, omissão e má fé foram distribuídas.  O governador pediu desculpas. Ninguém o acompanhou. Nem se deu ao trabalho de examinar as próprias responsabilidades. Anunciam, entretanto, a criação de uma força tarefa para punir os culpados. No particular, agiram rápido, tal qual o capitão Renault em Casablanca: “Round up the usual suspects”. 

 

Nesse teatro de operações muitos são amadores, como se vê – mas alguns são profissionais. Como disse o Mestre Adolfo Boos Jr, ao dar o cheque mate no quarto lance de minha primeira lição de xadrez. Os reis, as damas, os cavalos, os bispos, as torres, todos são peões, apenas com outros nomes de batismo. São peças, não se dirigem. Outras mãos as dirigem. E ao final de cada partida trocam de lado. Mas não de cor: as brancas continuam brancas, as pretas, pretas. À plateia, que assiste, cabem as despesas. E os custos. Que se elevam, a cada temporada. Aos players, a féria. Inevitabĭlis, perennis. E entre gambitos e roques, fiéis e infiéis, titereiros e títeres, seguimos todos o jogo da vida...

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